terça-feira, 17 de agosto de 2010

Ração

É estranho como cães nunca estão tristes ao comer. Cães se lambuzam, fazem barulho, rosnam e mordem a aproximação de pessoas, mas mesmo assim exibem sempre um sorriso de caninos afiados quando comem. A felicidade parece fazer parte do respeito para com a comida, a presa, a caça. Talvez até respeito para com a morte do que se come.

Quisera eu comer como um cão, infelizmente o faço como gente.  Como em pratos de louça branca com garfo e faca, mantenho a coluna ereta, ás vezes - acreditem! - até mesmo tiro o boné. Essa forma de comer me enoja. Pareço assustadoramente civilizado à mesa.

Hoje vi que alguém comia só. Ao contrário dos cães, seres humanos apreciam a companhia, e eu pude reparar que também ao contrário dos cães os seres humanos se sentem tristes. Hoje vi que alguém parecia mergulhado em tristeza enquanto comia.

Não sei onde quero chegar, não me pergunte, mas vejo que não há porque comer tão civilizadamente quando não há em torno de si civilização - pessoas falando, rindo, te olhando e sendo olhadas de volta. Se não há nada disso, ou se nada disso lhe tráz felicidade, então você é só e, sendo só, deveria comer como um cão. Se comesse como um cão seria ainda só, mas talvez fosse feliz. Procuro ser um pouco como um cão, todos os dias da minha vida.

Nenhum comentário:

Postar um comentário